domingo, 8 de maio de 2011

Crônica: "Cabeças erguidas"

Por Júlia B., estudante de História da USP
“Se os alunos levantassem a cabeça de suas bandejas, veriam onde estão os negros, onde estão as mulheres negras na Universidade – servindo”. Foi assim que Pablito, diretor do Sintusp, funcionário da USP e militante da LER-QI resumiu, em uma frase, a realidade da Universidade brasileira, não só da Universidade de São Paulo.
E na Universidade de São Paulo, os estudantes levantaram os olhos da bandeja. E o que eles viram não foi o cenário mais bonito da bolha da “universidade de excelência”. Eles puderam ver, por mais que não quisessem,  a sujeira por trás da construção do sistema USP, a sujeira por trás do sistema Rodas.
E os estudantes deixaram as salas de aula, e invadiram os corredores e as rampas da FFLCH – sempre com aquela fama de sujinha, agora uma fama legitima. E quem fez esses estudantes levantarem suas cabeças dos textos sobre escravidão, das aulas sobre fome, das teorias sobre o fim da luta de classes? Trabalhadores e, sobretudo trabalhadoras da empresa limpadora União, terceirizados que vivem num regime de semi-escravidão (pra não dizer escravidão de fato), superexploração  da força de trabalho pelo patronato e que estavam sem receber seus salários, passando fome. E de repente, a teoria virou prática e a História passou a ser feita no ali e agora, fora da sala de aula. E o mais importante, era a História sendo feita por àqueles que eram, até então invisíveis e coadjuvantes.  Agora, os limpadores e limpadoras terceirizados da USP tinham consciência da sua classe, da exploração que sofriam, dos riscos a que eram expostos, e então resolveram tomar de volta um direito que lhes fora tirado à força, um direito básico de todo ser humano: direito à voz. E foi com ajuda do Sintusp, dos militantes trotskistas da LER-QI, de estudantes independentes e de todas as correntes que se mobilizaram e deram todo o apoio a luta dos terceirzad@s da USP. 
Com esse apoio, a força na continuidade da greve, as manifestações e piquetes em frente à reitoria, dias e dias de cansaço e muita força, que deram a esses trabalhadores e trabalhadoras o que lhes era de direito: o salário pelo serviço feito. E não só isso, mas também os direitos trabalhistas que lhes foram negados. E a reitoria, que até então “não tinha nada a ver com isso” rendeu-se a força de mobilização desses guerreir@s e pagou o que lhes havia sido roubado.
É nessa luta que nós continuamos. Uma luta que vai além do direito desses trabalhadores de receberem pelo seu serviço. É uma luta pelo fim da precarização das condições de trabalho desses terceirizados, e mais, é uma luta pelo fim da terceirização dentro e fora da USP. Terceirizar é superexplorar, semi-escravizar e impor homens e mulheres a condições subumanas de trabalho em troca de um salário de miséria, que muitas vezes nem é pago.  E é nessa luta que nós estudantes nos juntamos com esses trabalhadores, uma luta que tem como fim o fim da terceirização na USP e fora dela, a incorporação desses trabalhadores como efetivos e um “basta” no projeto Rodas de precarização da nossa universidade.  É também pelo fim do projeto de precarização dos serviços em favor do lucro máximo para uma parcela mínima, em todo o país. Porque, como disse em poucas e muito sábias palavras uma das trabalhadoras da União, “enquanto houver terceirização, haverá escravidão”. E é por isso que temos que levantar nossas cabeças das nossas bandejas e nos unir.  A nossa luta é todo dia e a nossa classe é uma só. Para além dos portões da USP: Uma só classe, uma só luta!

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